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O mapa branco do cansaço dos olhos
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Eu já rezei a deuses de jade e de marfim,
em línguas que nunca poderia entender,
só para pedir pela saúde daqueles que amava.
Eu já entrei nos templos do assombro dos milénios,
viajante no labirinto dos meus mistérios,
e dei nome aos meus medos e aos meus sonhos.
Eu já tive a idade oblíqua dos penitentes
sem pátria e sem casa e cresci para além dela,
menino assustado a fingir que era homem.
Eu já cobri com linho a púrpura das minhas feridas
e defendi nas batalhas a honra das minhas damas
e nunca fui ostracizado nem queimado em efígie.
Eu fui engolido pelos ventos e devorado
pelas dúvidas no alvorecer do meu tempo atormentado.
E agora que procuro o norte no mapa branco
do cansaço dos meus olhos, o que vejo são vermes
alcandorados à condição de homem
à varanda da grandeza dos seus títulos
sem se darem conta de que são mais mortais
que as formigas que a poeira aniquila junto às bermas.
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José Jorge Letria, in "Produto Interno Lírico"
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O mapa branco do cansaço dos olhos
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Eu já rezei a deuses de jade e de marfim,
em línguas que nunca poderia entender,
só para pedir pela saúde daqueles que amava.
Eu já entrei nos templos do assombro dos milénios,
viajante no labirinto dos meus mistérios,
e dei nome aos meus medos e aos meus sonhos.
Eu já tive a idade oblíqua dos penitentes
sem pátria e sem casa e cresci para além dela,
menino assustado a fingir que era homem.
Eu já cobri com linho a púrpura das minhas feridas
e defendi nas batalhas a honra das minhas damas
e nunca fui ostracizado nem queimado em efígie.
Eu fui engolido pelos ventos e devorado
pelas dúvidas no alvorecer do meu tempo atormentado.
E agora que procuro o norte no mapa branco
do cansaço dos meus olhos, o que vejo são vermes
alcandorados à condição de homem
à varanda da grandeza dos seus títulos
sem se darem conta de que são mais mortais
que as formigas que a poeira aniquila junto às bermas.
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José Jorge Letria, in "Produto Interno Lírico"
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